31 de março de 2009

PRESSÕES OU TALVEZ NÃO. Toda a gente já percebeu que as alegadas pressões de que estarão a ser alvo os procuradores que investigam o «caso Freeport», e que o presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público promete revelar a seu tempo, vão dar em nada. Pior: servirão, apenas, para introduzir ainda mais ruído num caso onde o ruído é mais que muito. É que é duvidoso, para começar, que João Palma tenha provas do que diz, e mesmo tendo-as ninguém acredita que, chegada a hora da verdade, se atreva a chamar os bois pelos nomes. Aliás, o procurador-geral da República já veio negar a existência de pressões sobre os procuradores, e aproveitou a ocasião para mandar um recado: «fracassarão» quaisquer manobras que visem criar suspeição e desacreditar a investigação, disse Pinto Monteiro. Disse mais: «os magistrados titulares do processo expressa e pessoalmente reconheceram» não existir «qualquer pressão ou intimidação que os atinja ou impeça de exercerem a sua missão com completa e total serenidade, autonomia e segurança». Como se vê, alguém está enganado (ou a enganar-nos) nesta história das pressões. O que vale é que já estamos de tal modo habituados a que isto seja assim que estranharíamos caso fosse doutra maneira.
TIRO NO PORTA-AVIÕES. Alberto João Jardim tem pouca autoridade para falar de democracia, nomeadamente da ausência de democracia, mas foi certeiro quando disse, sobre o «caso Freeport», que Sócrates já teria sido substituído caso fosse primeiro-ministro de um «país democrático». Por mais que se exija ou implore, a Justiça não fará, no caso do outlet de Alcochete, mais nada do que já fez (que foi nada), e quanto à celeridade do processo escusado será dizer que mais vale esperar sentado. Como há muito se percebeu, o caso vai arrastar-se eternamente, pelo que o primeiro-ministro ficará, pelo menos enquanto estiver em funções, sob a suspeita de ter praticado actos que não devia ter praticado. Não é agradável, sobretudo no caso de estar inocente, mas quem se mete a exercer cargos políticos sabe ao que vai. Pior é o País suspeitar que o primeiro-ministro que temos é corrupto e a Justiça ser incapaz de confirmar a suspeita ou desmenti-la de forma inequívoca.
SUPERSTIÇÃO. Só espero que não comecem, agora, a espalhar alhos no balneário.

30 de março de 2009

DESVARIOS. Oh dona Maria João Avillez, e que tal acabar com os apoios do Estado à ópera, ao teatro dito independente, e ao cinema que ninguém vê? Afinal, por que motivo gastar tantos milhões de euros em actividades que só interessam a meia dúzia de gatos-pingados? Não estaremos perante os mesmíssimos «desvarios megalómanos» de que fala quando fala das «linhas de ferro no Douro»?
Assino por baixo, por cima, e pelos lados.

27 de março de 2009

REPÚBLICA PORTUGUESA DA VENEZUELA. É normal encerrar-se uma linha férrea sem que os utentes sejam previamente avisados? A julgar por aquilo que se viu, parece que é normal. Mas a razão invocada pela secretária de Estado dos Transportes (um relatório tê-la-á alertado para um problema de segurança nas linhas do Corgo e do Tâmega) não me convence. Pior: chega a parecer-me uma provocação. Se é verdade que foram encerradas por causa de um relatório (conhecido na última terça), como se explica a existência, no dia seguinte, de um plano alternativo a funcionar em pleno de molde a colmatar a ausência dos comboios? Como é evidente, a história não está bem contada. As coisas levam o seu tempo a fazer-se, e não se responde de um dia para o outro a uma situação como aquela que terá apontado o relatório. Como não há milagres, torna-se claro que tudo isto foi cozinhado há largo tempo e às escondidas das populações servidas por aquelas ferrovias, naturalmente procurando evitar-se protestos sempre desagradáveis. Estranho, por isso, que praticamente ninguém se indignasse com o que me parece um precedente que pode sair-nos caro. Imagine-se que o Governo decide, à socapa, encerrar, de um dia para o outro, a auto-estrada que liga o Porto a Lisboa, e que os utentes tomam conhecimento da medida no próprio dia em que a decisão entrou em vigor e descobrem, como não bastasse, que houve um reforço de comboios e autocarros entre as duas localidades, isto é, a existência de um plano alternativo. Não estaríamos agora a dizer que nem um país do terceiro mundo se atreveria a tanto?

26 de março de 2009

JUSTIÇA, DISSE ELA. Só um ingénuo empedernido terá ficado surpreendido com a absolvição de Ferreira Torres pelos seis crimes que lhe foram imputados, e certamente que nem um ingénuo empedernido terá ficado surpreendido que o ex-autarca do Marco de Canaveses tenha dito, mal foi conhecida a sentença, que foi «perseguido» pelo Ministério Público. Mas já me parece demasiado que a presidente do colectivo de juízes que absolveu o sujeito nos tenha feito o imenso favor de explicar que a decisão foi tomada com base em «prova produzida» na sala de audiência «e não no que se diz lá fora», e que não tenha resistido à tentação de nos dizer que «a justiça popular é uma coisa bem diferente da aplicação da justiça pelos tribunais». Demasiado porque o «recado» da sra. juíza me parece despropositado, e porque, à excepção de Ferreira Torres e dela própria, duvido que haja um só português que ache justa a sentença. Quanto a Ferreira Torres, que naturalmente aproveitou a ocasião para disparar em todas as direcções e nos lembrar que é candidato à presidência da Câmara do Marco (ele pode ser tudo mas não é burro), ainda há-de chegar a Presidente da República.

25 de março de 2009

POUCA VERGONHA. Será que os mandarins da bola têm a noção do que andam para aí a dizer? Ter-lhes-á passado pelas cabeças que a gravidade do que afirmam pode causar danos maiores? Fui só eu que ouvi, ou já há quem tenha sido ameaçado de morte? Estão à espera que alguém dê um tiro em alguém para perceberem que deitar gasolina na fogueira pode acabar em tragédia? Quanto custa, já agora, chamar «ladrão» a um árbitro? É que, a avaliar pelo que se tem visto, é de borla, ou quase de borla. E quando resolvem eles dar-se ao respeito, queixando-se nos tribunais de quem os calunia e recusando desempenhar funções enquanto os não respeitarem? As coisas chegaram a um ponto em já não há árbitros sérios, muito menos competentes, e ainda menos as duas coisas.
O melodrama do leão

24 de março de 2009

DA INCOMPETÊNCIA. Os sites dos jornais portugueses vão-se modernizando, mas continuam cheios de erros. No novíssimo DN, a opinião desapareceu em parte incerta. No Expresso, há textos que apenas se podem ler parcialmente. No Público, há páginas e páginas que só se lêem em formato gráfico, e a pesquisa é sofrível. Nada disto se vê nos congéneres ingleses, espanhóis ou franceses. Por que será?

23 de março de 2009

OBTUSIDADE CÓRNEA*. Todos erramos nas tarefas do dia-a-dia, e todos achamos normal que assim seja. Há, porém, uma excepção: árbitro de futebol que erra, é incompetente ou ladrão. Não era Lucílio Baptista um árbitro competente e um homem sério antes do fatídico Sporting-Benfica? Como não vi quem o contestasse, presumo que ninguém tinha dúvidas a esse respeito. Chamar-lhe incompetente ou ladrão após cometer um erro, mesmo um erro que alterou a «verdade desportiva», caracteriza melhor os que o acusam que o alvo das acusações.
* Expressão roubada a Eça de Queirós
PROVEDOR. A avaliar pela ausência de comentários, sobretudo na blogosfera, devo ser o único que lê, semanalmente, o Provedor do Leitor do Público. Aproveito, já agora, para dizer que o faço com gosto, e que aprecio o rigor e o desassombro com que Joaquim Vieira exerce a sua função. Digo mais: faziam bem os jornalistas em prestar-lhe mais atenção.

20 de março de 2009

FIGURAS TRISTES. Cruzei-me, há pouco, com um abantesma que a Justiça diz não conseguir notificar por desconhecer o seu paradeiro. Como conheço o poiso do sujeito (pelo ror de gente que o conhece chega a parecer que só a Justiça o não conhece), ofereço os meus préstimos à Justiça caso ela queira saber o paradeiro do dito. Não que eu tenha vocação para bufo, calma aí. Mas porque pode ser que a Justiça nos poupe, assim, a figuras tristes.
FERNANDO PESSOA, SEMPRE. A propósito do sal e doutras coisas que fazem mal, que o Governo elevou a questão nacional e a Oposição aplaudiu, vale a pena lembrar o que disse Fernando Pessoa num texto publicado no volume Ensaio e Critica: «(...) se o Estado nos indica o que havemos de beber, por que não decretar o que havemos de comer, de vestir, de fazer? Por que não prescrever onde havemos de morar, com quem havemos de casar ou não casar, com quem havemos de dar-nos ou não dar-nos? Todas estas coisas têm importância para a nossa saúde física e moral; e se o Estado se dispõe a ser médico, tutor e ama para uma delas, por que razão se não disporá a sê-lo para todas?»

18 de março de 2009

DISCRIMINAÇÃO POSITIVA, DIZ ELA. Se a sra. que manda na Direcção Regional de Educação do Norte considera que a concentração de alunos de etnia cigana numa só turma é «discriminação positiva», é caso para desconfiar. Afinal, Margarida Moreira tornou-se conhecida graças a alguns episódios que não abonam a sua competência, o penúltimo dos quais envolvendo missivas onde atropela a gramática. Depois, onde foi ela buscar a ideia de que a «discriminação positiva» é, de facto, positiva? Tirando o seu afastamento do cargo que desempenha, medida que já se tornou um caso de higiene, confesso que não estou a ver mais nenhum caso em que a medida possa ser positiva.
INCOMPATIBILIDADE. Infelizmente, ser poeta e político não é, como diz João Miguel Tavares, incompatível. Como se pode ver pelos inúmeros exemplos conhecidos, poetas-políticos e políticos-poetas, isto é, maus políticos e péssimos poetas, é coisa que mais há. Sim, a incompatibilidade existe. Mas existe, apenas, para quem é bom numa coisa ou noutra, o que não é o caso.

16 de março de 2009

MORAL DE OCASIÃO. Arons de Carvalho insurge-se, no Expresso, contra os media que, segundo ele, usam e abusam da informação resultante de violações do segredo de Justiça para fins comerciais ou políticos. Como me parece evidente a qualquer cidadão consumidor regular dos media, o deputado tem, em parte, razão, mesmo reconhecendo-se que ele não está em condições de poder, sobre esta matéria, pronunciar-se com isenção. Acontece que a Justiça, que não lhe mereceu o mais leve reparo, apenas se mexe em casos como o Freeport quando há fugas de informação que acabam nos media, como Arons muito bem sabe. Ao contrário do que diz o ex-secretário de Estado da Comunicação Social, os media acabam, talvez involuntariamente, por ser mais úteis que prejudiciais ao andamento dos processos. Não digo isto motivado pelo espírito corporativo, que não tenho. Digo-o porque é uma evidência que os vários exemplos demonstram.
MULHERES. Passou-me completamente despercebido o Dia Internacional da Mulher (a minha pede-me contas em todos os aniversários menos neste), mas socorro-me dos sábios conselhos do Filipe Nunes Vicente, que faço meus: «Cosam umas meias, façam uma sopa, aspirem a casa e cuidem dos filhos. Como já fazem tudo o resto (até conduzir), só vos falta isso para serem perfeitas.»

13 de março de 2009

ASSOBIAR PARA O LADO. Conseguem imaginar o que se diria caso George W. Bush dissesse que 70% dos talibãs a combater no Afeganistão são mercenários e, como tal, compráveis? Pois bem, o vice de Obama anunciou isto mesmo, e ninguém diz nada. Valha a verdade que nada disto me surpreende. Não me surpreende o silêncio generalizado, nem me surpreende que paguem a mercenários para que deponham as armas. Afinal, votei Obama por achar que ele, em matéria de política externa, se renderia ao pragmatismo, e é isso o que está a acontecer. Mas já me chateia que a mesmíssima política externa ainda há pouco tão criticada não mereça, agora, o mais leve comentário.
A Marcha dos Grupos Excursionistas

11 de março de 2009

PORNOGRAFIA. Além de um atentado à liberdade de expressão de fazer lembrar os piores tempos de antigamente, como foi dito e repetido pelos «guardiões do regime» e me pareceu uma comparação obscena, quatro juristas garantiram, ao Público, que a apreensão de meia dúzia de livros que na capa contêm a reprodução de uma obra de Courbet representou «uma falha monumental» da PSP «no campo da cultura», e um episódio que, segundo eles, «identifica o baixo nível cultural» da dita. (O restante está aqui.)

10 de março de 2009

VÓMITO. Quem vê com alguma regularidade as performances televisivas de Medina Carreira sabe bem até que ponto ele é pessimista. Mas a verdade é que as catástrofes por ele enunciadas não têm nada de gratuito, muito menos demagógico. Como se viu na última entrevista à SIC, os factos demonstram que as coisas são o que são, e não é fingindo que não são que passam a ser doutro modo. Aliás, os cidadãos estão fartíssimos de fingidores e de malabaristas. Estão fartíssimos, por exemplo, de políticos como os que hoje mesmo elogiaram o presidente angolano, a pretexto de que Eduardo dos Santos estará a «fazer esforços» para a «consolidação da democracia» em Angola. Quem não sabe o que se passa em Angola e quem é Eduardo dos Santos? Pelos vistos, só os políticos que temos. Em nome do interesse nacional, dirão eles, embora todos saibamos que o interesse nacional frequentemente se confunda com os interesses de meia dúzia.
MURRO NO ESTÔMAGO. Notável a crónica de César das Neves no DN de ontem.

9 de março de 2009

A LÓGICA DE VITAL. «Eis uma notícia que não será manchete», disse, pesaroso, Vital Moreira sobre a notícia de que Portugal subiu cinco lugares no ranking europeu. Acontece que a mesma notícia o incomodaria por razões opostas caso fosse outro o Governo. Incomodaria por ser notícia, e escandalizá-lo-ia caso um jornal fizesse dela manchete. Para Vital Moreira, as coisas são boas ou más não por aquilo que são, mas consoante o lado de que se está.

6 de março de 2009

CRONISTAS. Custa-me ver alguns dos nossos melhores cronistas reduzidos a dois ou três parágrafos, como sucede no Correio da Manhã, onde hoje se estreou João Pereira Coutinho. Não sei qual é a ideia dos editores, mas duvido que o modelo funcione. Aliás, é visível que alguns deles (ainda) não se adaptaram a tão pouco espaço. (Ver, também, este post do Miguel Morgado.)
DEPUTADOS. Nos tempos de Eça, estas coisas resolviam-se com garrafas de Colares e umas bengaladas.

5 de março de 2009

A REALIDADE É UMA CHATICE. É provável que Pacheco Pereira tenha razões para vergastar os media por estes não se comportarem como, na sua opinião, deviam, mas chega a ser confrangedor vê-lo andar por aí a ler os jornais com uma lupa, e a agir como um desesperado. Por mais jeito que lhe dê, o problema do PSD não é a hostilidade da imprensa à actual líder, ou as conspirações destinadas a decapitá-la. O problema dos sociais-democratas é a liderança, ou essencialmente a liderança, que só os indefectíveis (como Pacheco Pereira) não reconhecem como um desastre. De nada lhe vale esbracejar como um náufrago ou inventar bodes expiatórios que as coisas são o que são, e só não vê que assim é porque a realidade lhe é demasiado cruel.
TUDO EM FAMÍLIA. Li que Pinto da Costa justificou um encontro com o árbitro Augusto Duarte em vésperas de um jogo entre o Beira-Mar e o FCP porque o árbitro lhe pediu ajuda para «um problema familiar». Ora, a ser verdade o que diz o presidente do FCP, impõem-se, desde já, duas perguntas. O pedido de ajuda de Augusto Duarte foi, ou não foi, atendido? Estaria o árbitro pedinte em condições de dirigir o jogo como determinam as regras? A resposta à primeira pergunta só o tribunal a poderá dar. Mas a resposta à segunda não tem nada que saber: a ser verdade o que diz Pinto da Costa, o simples pedido de ajuda demonstra, por si só, que o árbitro não estava em condições de ajuizar com imparcialidade. Tenha sido ajudado, ou não.
AI CAROLINA. Carolina Salgado não me inspira qualquer simpatia. Nem quando foi primeira-dama do FCP, nem quando deixou de ser primeira-dama do FCP, nem quando publicou o livro onde desanca o presidente do FCP. Dito isto, importa salientar que Carolina contribuiu (e continua a contribuir) para que se saiba um pouco mais sobre a corrupção e as patifarias que rodeiam o futebol, e isso só pode ser positivo. Todos sabemos por que motivo Carolina resolveu pôr a boca no trombone, e não custa imaginar que a esta hora estaria caladíssima caso fosse outro o cenário, mas é mais importante o que tem ela a dizer à Justiça que a intenção com que o faz. Isto, claro, partindo do princípio que a Justiça vai fazer alguma coisa com essas revelações, o que se duvida. Para já, nem sequer foi capaz de a proteger quando ela foi ao tribunal prestar declarações sobre o envelope que o ex-companheiro terá entregue a um árbitro como forma de lhe agradecer os bons serviços prestados (ou a prestar, não se sabe bem). Resta esperar que o clima intimidatório instalado à porta do tribunal, cujo beneficiário é por de mais evidente, não tenha sido do prévio conhecimento do dito tribunal. É que, se foi, não se perceberia por que não tomou as medidas que se impunham.

3 de março de 2009

RESULTADO DO INQUÉRITO QUE AINDA NÃO COMEÇOU. Estou em condições de vos poder revelar, julgo que em primeira mão, o resultado do inquérito que o Conselho Superior do Ministério Público decidiu instaurar de molde a apurar as razões para os «longos períodos de ausência de movimentação do processo» criminal que envolveu o presidente da Câmara de Braga. Só não vos posso é prometer que o resultado seja uma surpresa, mas esperar que a Justiça nos surpreenda é, convenhamos, esperar demasiado.
«A sua licenciatura manhosa, os projectos duvidosos de engenharia na Guarda, o caso Freeport, o apartamento de luxo comprado a metade do preço e o também cada vez mais estranho caso Cova da Beira não fazem necessariamente do primeiro-ministro um homem culpado aos olhos da justiça. Mas convidam a um mínimo de decoro e recato em matérias de moral.»